domingo, 4 de novembro de 2018

Entendendo o Marxismo - Mercadoria

A Burguesia

Durante a Idade Média, surgiu uma quarta classe de pessoas, entre os já pre-existentes Realeza, Nobreza e "arraia miúda" (populacho, povaréu, gentinha, ralé). O comércio era feito à base de troca (escambo) e isto dificultava o acúmulo de riquezas por parte das duas primeiras classes. Sabia-se que ambas eram ricas apenas pela demonstração aparente do seu modo de vestir e do modo de viver. Elas possuíam bens e propriedades, porém sem uma forma precisa de avaliação.

Neste contexto, precisava aparecer alguém que fizesse a conversão da quantidade de um bem em outro, na hora da TROCA. Quem passou a fazer, inteligentemente, este papel foi a burguesia.

Suponhamos o seguinte exemplo. Um nobre encarrega um comerciante (burguês) de lhe conseguir trigo. Para isto, lhe dá 12 ovelhas para trocar. O comerciante lhe diz que a pele vale mais do que a carne, que não pode garantir se todas sobreviverão à viagem, e que portanto fará a troca pelas peles, e não pela pele e carne. O nobre concorda.

No mercado inglês, segundo levantamento de Adam Smith (A Riqueza das Nações), 12 peles de ovelhas compravam 94,5 Kg de trigo. Mas o burguês precisava garantir sua taxa de troca, pois tinha que sobreviver. Ele teria que pagar a viagem das ovelhas e o transporte do trigo na volta. Portanto, ele pode tirar 10 kg de trigo para si, além de ficar com a carne das ovelhas. Assim esta classe burguesa foi acumulando o seu capital.

A Mercadoria

Para o burguês, portanto, a sua riqueza era expressa pelo acúmulo de mercadorias que conseguia.

Neste momento entra o filósofo (exclusivamente isto1), com a sua teoria sobre Mercadoria.

Na visão de KM (Karl Marx, para simplificar o texto), a Mercadoria possuía dois valores:


O valor de uso não exprime nenhuma relação social de produção.

O Valor de Troca é a "relação quantitativa segundo a qual os valores de uso são permutáveis entre si". Como não havia ainda o dinheiro, havia a necessidade de estabelecer a relação entre os valores de uso das duas mercadorias que entravam em uma negociação específica.

Segundo KM:

"As mercadorias, tomadas em quantidades determinadas, equilibram-se, substituem-se na troca, avaliam-se como equivalentes, e representam assim, apesar da variedade das suas aparências, a mesma unidade."

"Os valores de uso são, de modo imediato, meios de subsistência".

Trabalho geral abstrato

No caso do trabalho artesanal, ou mesmo nas múltiplas funções dos empregados em uma fábrica, a valoração do trabalho poderia se tornar impossível, então KM define um trabalho abstrato, da seguinte forma:

"Mas como Valores de Troca representam trabalho igual não diferenciado, isto é, trabalho no qual se apaga a individualidade dos trabalhadores. O trabalho criador do Valor de Troca é, pois, o Trabalho Geral Abstrato".

Nest ponto temos que discordar veemente e logicamente de KM, pois cada trabalhador tem, na sua individualidade, mesmo naqueles tempos, e com mais razão nos tempos modernos, um conhecimento, habilidades, cursos de aperfeiçoamento, que influem na velocidade de seu trabalho, e na qualidade deste, fazendo com que a mercadoria seja um pouco melhor do que a média, caso não seja feita por máquina altamente padronizada.

"O tempo de trabalho é a existência viva do trabalho, não interessa a suaforma, o seu conteúdo, a sua individualidade; é o seu modo de existência viva na sua forma quantitativa, e simultaneamente a sua medida imanente".

Assim nasceu o Trabalho Medido pelo Cartão de Ponto.

Valor de Uso

O Tempo dispendido no trabalho para produzir uma mercadoria é a medida do seu Valor de Uso. Uma vez produzida a Mercadoria, temos o seu Valor de Troca. Este Valor de Troca é o "Tempo de Trabalho Coagulado" que foi necessári para produzir a Mercadoria.

Trabalho Simples

O Trabalho a que KM chamou de Trabalho Simples é um trabalho despido de qualidade. É o modo específico pelo qual o Trabalho cria o Valor de Troca, chamado por ele de Trabalho Social.

O Trabalho Social tem duas categorias: aquele que se realiza em Valor de Uso e aquelçe que se realiza em Valor de Troca. Este último era o que cabia à burguesia.

KM reduzia todas as mercadorias a uma só abordagem: ao tempo dispendido no trabalho para a produção da mesma. O indivíduo é como um órgão de trabalho.

A definição de KM para o Trabalho Simples é "trabalho para o qual qualquer indivíduo médio pode ser preparado".

Trabalho Complexo

O Trabalho Complexo se expressa como um múltiplo maior que 1 (uma) unidade em relação ao Trabalho Simples.

Trabalho Social

Expressa-se na igualdade do trabalho de indivíduos diferentes sob as mesmas condições.

Nesta definição KM está procurando a igualdade das pessoas na igualdade perante a produção de um mesmo valor de troca. Temos que levar em conta que, nos primeiros anos da Revolução Industrial, as pessoas trabalhavam até 18 horas por dia para atender a demanda da época, notadamente pelos produtos têxteis.

Esta simplificação da IGUALDADE SOCIAL é uma deturpação da definição da igualdade social dos indivíduos como pessoas separadas, com virtudes e dons peculiares à sua identidade no mundo.

KM usa "trabalho abstrato", "trabalho simples" e a própria sociedade industrial incipiente para definir um "indivíduo médio", através do Valor de Troca das mercadorias que ele produz, sob as condições controladas que ele estabelece teoricamente.

Ao invés de igualar as pessoas pela sua condição humana, ele procura a igualdade no fenômeno econômico da produção de mercadorias, tentanto também valorar esta igualdade no Valor de Troca de bens produzidos.

Esta é a perniciosidade da Teoria da Mercadoria de KM. Mas existe um outro aspecto ainda não percebido nesta pretensa Igualdade.

Ao definir Trabalho simples, e como consequência obter a Igualdade pela média dos indivíduos capazes de aprender a produzir satisfatoriamente uma Mercadoria, definindo, logo após, o Trabalho Complexo, ele abre o precedente óbvio de que

EXISTEM INDIVÍDUOS QUE EXECUTAM UM TRABALHO COMPLEXO, ACIMA DA MÉDIA DA MAIORIA, QUE EXECUTA O TRABALHO SIMPLES

Adivinhem quem são estes indivíduos ?

OS DIRIGENTES QUE ORGANIZARÃO O TRABALHO, DEFININDO QUANTO SERÁ PRODUZIDO DE CADA MERCADORIA2.

Conhecemos muito bem o resultado desta premissa dos regimes que pregam a ORGANIZAÇÂO DO TRABALHO. Nos regimes Socialistas e Comunistas. cabe ao governo e sua casta, a atribuição de um Trabalho Complexo, cuja medida do Valor de Uso é imponderável, chegando às raias do infinito.

Mas KM insiste que existe uma igualdade social:

"O trabalho de qualquer indivíduo, quando se manifesta em Valores de Troca, possui este caráter social de igualdade, e só se manifesta no valor de troca, quando relacionado com o trabalho de todos os outros indivíduos, e é considerado como trabalho igual".

Ou seja, dentro do sistema produtivo, de uma ou outra forma, perante os valores de troca praticados, o trabalho de todos os trabalhadores é igual.

Contexto destas definições de Karl Marx

KM se beneficiou dos eventos que se deram durante o início da Revolução Industrial na Inglaterra, pois sem a produção em larga escala, a diferença de Tempos de Trabalho para um trabalho artesanal apareceria nitidamente.

No trabalho artesanal a diferença de habilidades se mostraria nítida e indelevelmente, jogando completamente por terra os conceitos de Marx.

A seguir

No próximo artigo falaremos mais sobre op valor das marcadorias.

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1 - Karl Marx só pode ser visto como filósofo, pois nunca foi empregado de uma fábrica e nunca foi empresário. As contribuições de Engels, filho de empresário, não podem ser vistas como muito práticas, pois ele já estava "contaminado" pela empatia com os empregados da tecelagem do pai, até chegando a se casar com uma das ex-empregadas da fábrica do pai. Karl Marx foi apenas um jornalista, que mal conseguia o suficiente para sustentar a si mesmo, à esposa e aos seus filhos.
2 - Condição "sine qua non" de uma economia controlada pelo Estado (controle dos meios de produção).

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